cabelo vermelho de paixão

idas ao cromatógrafo

sexta-feira, março 02, 2007

 

azul azul

a tinta rebola da calçada da sé
escapa à água benta
e deixa marca na estrada
uma linha azul inclinada
chega doce ao Rossio
depois sobe num rodopio
azul para cima
azul para baixo
no alcatrão
no paralelo
o traço

quinta-feira, fevereiro 15, 2007

 

de gelo

veio o inverno e ficou
por entre primaveras
inverno ao largo do Verão

terça-feira, janeiro 09, 2007

 

bem me quer

no som da calma
balanças a ovelha que trazes sólida no badalo

nas ceroulas da véspera
vestes o ritmo marcado do bater do pó nos passos

grande mundo é este mundo de caminhos

chegas com um olhar de menina no briho da voz
corres corres voltas a correr sem tréguas
e demoras a dizer adeus

existes em ti
naquele outro que espreita
no som da alegria saido do frio que te passa nas orelhas
no olhar ao horizonte que se anuncia
bonito como um burro num campo

choras em cada sorriso
das coisas que fazes sem querer
das batatas que apanhas
nos sorrisos que semeias para o feno que aí vem
e choras

terça-feira, novembro 14, 2006

 

blusa tonta

espera
não feches o armário
ando à tua procura
onde é que estás?
na cruzeta azul?
mas estas são todas vermelhas
e só têm os teus fatos
nunca percebi porque precisas de tantos
todos novos
praticamente a estrear
espera
não feches o armário
ando à tua procura
deixa-te de brincadeiras
onde é que te puseste?
na gaveta da direita?
aqui só encontro os cachecóis e as luvas
que usas desde outubro no início do frio simples
até aquela nuvem branca de maio
espera
não feches o armário
ando à tua procura
na caixa por cima de tudo?
aqui estás
o teu sorriso e o teu olhar
os que vestes quando sais para mim
espera
não feches o armário
ando à tua procura
do teu corpo todo
não
não feches o armário
não me deixes só dobrada escura e engomada

segunda-feira, novembro 06, 2006

 

reflexo

na proporção de infinitas chávenas de café para uma de consciência violenta
a aranha tece princípios de creme e de espessura quente

em posições radicais um outro alguém passa à desordem
no sítio necessário à ausência de querer mais

sabe a queimado o que ardeu na distância desse sorriso aberto um dente para lá do saudável
o olhar deriva dos tições em brasa para um peito só de fios e buracos

palavras torradas no instante da agresão calada
gelo que nasce na ilusão que a teia é

sexta-feira, outubro 27, 2006

 

ser que será

será que fazes ideia de como gosto de ti?
de como ouço a tua voz
e de como vejo o teu olhar
será que fazes ideia de como te sinto?
de como sei que me aceitas
e de como gosto que gostes
será que fazes ideia de como me pertences?
de como és a minha pele
e de como és o meu cheiro
será que fazes ideia de como te conheço?
de como crio o teu sorriso
e de como faço o teu sabor
será que fazes ideia do teu começo?
de como acabas a conversa
e de como rematas uma farsa
será que fazes ideia da ideia que és?
de como pensas que sou
e de como fazes que eu seja

terça-feira, outubro 24, 2006

 

fado tóxico

Parti sem conhecer o passado. Esqueci-me dele enquanto mergulhavas na espuma. Submergias inteira quando saí à socapa no vapor de água que subia os azulejos num bouquet de frutas tropicais. Aromas de sabonete e champô flutuavam num doce calor húmido e junto a ti, um pau de incenso consumia-se num contraste de fumo espesso e lento. Trazias sempre cheiros intensos das viagens à terra mãe.

Quando ontem me procuraste, despertei de um sono antigo de muito tempo. Demasiado longo talvez. Quando foi? Há quanto tempo fugimos os dois? Sem carimbos no passaporte, a olhar as estrelas e a desejar ser abraçados pela estrada?

Continuas a morar aqui, no local mais vibrante do planeta. Para mim o que foi o único sítio do mundo e para todos os outros o nº 30 da Rua da Gaveta. Engraçado como a chave entra facilmente na fechadura oxidada e faz accionar na perfeição as molas do velho canhão. O mecanismo é o mesmo e os nossos também virão a revelar-se assim, gastos, oleados mas ainda os mesmos um no outro. Os anos e os muros ganharam cores esbatidas e algumas rachadelas. Na varanda do teu quarto, a pequena buganvília cresceu e agora abraça toda a fachada num gesto terno de protecção. Ela nunca te abandonou.

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